quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Inquieta

Regressámos hoje de mais uma visita ao Prof. Yves Ville, Hospital de Poissy, Paris.
Sinto-me inquieta, angustiada.
Não há como não me sentir assim.
Fizémos mais duas daquelas super ecografias e uma ressonância magnética. Tenho agora 35 semanas e 5 dias de gravidez.
Aparentemente tudo está bem, a RM não regista quaisquer alterações fetais, e a ecografia também não. Contudo, quando analisei eu própria as medidas da bebé, não pude deixar de reparar que o perímetro cefálico está num percentil relativamente baixo (cerca de 10) estando o diâmetro bi-parietal (distância entre as fontes) no percentil 20 / 25. Embirrei com aquilo e o Prof. Yves Ville não me deixou sair de lá sem fazer uma segunda eco ao final da tarde, em que me mostrou que o perímetro cefálico é muito difícil de medir quando a cabeça do bebé, como é o caso da M., está já muito encaixada na pélvis. Ele mostrou-me que só se consegue ver cerca de 1/3 da circunferência cefálica e que a medida é, portanto, uma extrapolação. Ou seja, voltando a medir, ele obteve um PC no percentil 20/25 com relativa facilidade. Este percentil está longe de poder ser considerado microcefalia. Nem o percentil 10 é considerado microcefalia, só abaixo de 0. Ele quis que eu viesse embora descansada, mas confesso que continuo angustiada. É impossível viver esta gravidez como se não se passasse nada. Não deixo de pensar que somos uma família de cabeçudos, principalmente eu e o filhote que sempre andou com aquela cabeçona no percentil 90, quando tudo o resto está no 50.
Eu só consigo enfrentar bem os problemas quando tenho solução para o pior cenário. 
Mas para isto... para isto eu posso não ter solução. Pode não haver dinheiro, nem emprego, nem esforço, nem amigos nem boa-vontade que resolvam.
A questão é: faltam 3 semanas, se calhar nem isso. Estou a 3 semanas de poder ter que deixar de ter esperanças.
Tenho medo como acho que nunca tive na minha vida.

domingo, 18 de novembro de 2007

CMV - Citomegalovírus

O tal post que me tinha proposto a escrever sobre este malfadado vírus.
Chama-se Citomegalovírus, abrevia-se CMV e é da família da varicela.
Tanto quanto sei (aliás, todo este post é com base nas coisas que tenho lido sobre o cmv, não tem, portanto, nenhuma base científica) este vírus, quando contraído, não causa grande "mossa " a quem o contrai, a menos que tenha o seu sistema imunitário comprometido. Já li algures que cerca de 80% dos americanos quando chegam aos 40 anos já contraíram este vírus. Portanto é um vírus muito comum. É normal contraí-lo mais cedo ou mais tarde durante a vida. É provável que a seroconversão seja assintomática ou que provoque uma espécie de gripe mais ou menos ligeira.
O problema está quando quem o contrai pela primeira vez (primo-infecção) está, como já referi, com um sistema imunitário deficiente, ou - meu caso - grávida. Este vírus tem a capacidade de atravessar a placenta e atingir o feto em gestação que ainda não tem defesas suficientes para o combater. Segundo estatísticas que li, cerca de 60% das infecções primárias por CMV em grávidas não passam para o ambiente intra-uterino, contra 40% que passam (meu caso). Essa transmissão é confirmada por amniocentese que, nestes casos, só deve ser feita depois das 22 semanas de gestação para evitar falsos negativos uma vez que o vírus é de transmissão lenta.
Tendo-se confirmado a transmissão do vírus para o feto, existem entre 75% e 80% de hipóteses de este não ficar afectado contra 20% a 25% de hipóteses de estar afectado com sequelas normalmente graves. Pelos vistos entre as mais comuns está a surdez (está aliás provado que o CMV congénito é a maior causa de surdez não hereditária), mas também a paralisia cerebral em vários graus, cegueira ou outros problemas visuais, epilepsia, atraso mental, etc.
No caso concreto da gravidez, li que existem menos de 2% de hipóteses de uma mulher fazer uma primo-infecção por cmv na gravidez. Pelos vistos é um fenómeno menos comum que as infecções por toxoplasmose ou rubéola e deve ser por isso que ninguém lhe dá muita atenção. Por outro lado também já me disseram que pelo facto de não haver tratamento aprovado para primo-infecções por cmv na gravidez não está indicado o seu rastreio pré ou pós concepcional. No entanto, há muitos obstetras privados que pedem esta análise juntamente com as restantes. O problema é que se se detectar que houve seroconversão durante a gravidez (que ainda por cima só pode confirmar infecção fetal após amniocentese a partir das 22 semanas) não há grande coisa a fazer, a não ser interromper a gravidez.
Esta história da interrupção da gravidez é polémica de qualquer das maneiras. Mas sempre pensei que não o era tanto quando se tratavam de razões médicas. O drama é que mesmo quando se confirma infecção fetal, ainda existem 75% de hipóteses do bebé não estar afectado. Parece muito não é? Mas quem chegou aqui já calhou nos 2% de hipóteses de fazer uma primo-infecção na gravidez (!!) e também já calhou nos 40% de probabilidades de transmitir o vírus ao bebé. Depois disso tudo, 25% parece um risco altíssimo, principalmente quando pensamos que os piores casos são crianças que não ouvem, não vêem, não falam, não andam e passam toda a vida numa cama eventualmente alimentadas por tubos (os piores casos). Os casos menos graves podem ser apenas surdez, por exemplo.
Pelos vistos não há grandes conclusões quanto à correlação entre a gravidade das sequelas e o tempo de gestação em que ocorre a seroconversão. A minha foi no primeiro trimestre, o que parece logo mais grave uma vez que o feto ainda tem poucas células que se vão multiplicar. Ora se estas células forem afectadas então todas as que elas darão origem estarão igualmente afectadas e as consequências poderão ser gravíssimas. Mas também já me disseram que quando a infecção ocorre no primeiro trimestre se pode aplicar a lei do tudo ou nada: ou a afecção é tão grave que o feto nem sequer sobrevive (morte intra-uterina / aborto espontâneo) ou pura e simplesmente não afecta o bebé.
Seja como fôr, isto faz com que a gravidez seja um drama (perdoem-me aqueles que vivem dramas de outras proporções - mas sabemos que tudo o que sentimos na vida é relativo). E por isso já me perguntei vezes sem conta porque é que ninguém me avisou, porque é que não tive mais cuidado, porque é que engravidei, porque é que não esperei mais uns 6 meses, porquê?
O que é que eu não sabia que podia ter sabido, o que é que eu não fiz que podia ter feito:


1º - é necessário saber se se é ou não imune ao vírus antes de engravidar. Da mesma maneira que o sabemos relativamente à toxoplasmose ou à rubéola. Na verdade nunca se é totalmente imune ao cmv, mas se já o tivermos contraído antes, corremos apenas o risco de ter uma re-infecção contra a qual as nossas defesas agirão com uma eficácia completamente diferente do que acontece numa primo-infecção. Em conseqência disso, o risco de infecção fetal também é infinitamente menor.

2º - sabendo que nunca se contraíu esse vírus antes devemos estar avisados, especialmente se pretendemos engravidar, que corremos um risco, ainda que pequeno, de o contraír pouco antes ou durante a gravidez.

3º - se, além de não sermos imunes, tivermos filhos pequenos (menos de 3/4 anos) que estiverem no infantário ou em contacto com outras crianças pequenas ou se nós próprias, não tendo filhos, estivermos em contacto frequente com crianças pequenas, fazemos definitavemnte parte de um grupo de risco. Este vírus, nos infantários, assume proporções epidémicas, tanto quanto li, portanto é normal que as crianças o contraiam durante o primeiro ano de infantário, principalmente se estiverem naquela idade de trocarem brinquedos que metem na boca constantemente.

4º - apesar de ser difícil, é necessário ter cuidados redobrados de higiene no que respeita à troca de fluídos com estas crianças, filhos ou não. Nomeadamente na troca de fraldas, beijos, secreções nasais, banho, troca / partilha de colheres e copos durante as refeições, etc etc.

5º - Fazendo parte do grupo de risco, há sempre a hipótese de adiar a gravidez durante uns tempos na expectativa de fazer uma infecção por cmv num curto espaço de tempo, ou deixar, por exemplo, que o filho entretanto cresça um pouco mais, reduzindo ele próprio as probabilidades de contrair o vírus.

Eu não sabia nada disto. E devia ter sabido.

Acabei por descobrir - graças à maravilhosa partilha de informação que nos permite a internet - dois médicos pediatras que se dedicam ao estudo da infecção congénita por cmv ao longos dos últimos 20 anos. Têm acompanhado a minha gravidez por email, sugerindo algumas terapias que, apesar de experimentais, poderão eventualmente resultar. Eles são o Prof. Stuart P. Adler (Departamento de Pediatria, Doenças Infecciosas, Virginia Commonwealth University) e o Prof. Giovanni Nigro (Departamento de Pediatria, Universidade de L'Aquila, Italia). Desenvolveram um estudo sobre a administração de hiper imuno globulina anti cmv durante a gestação como forma de combater o vírus. A terapia é experimental mas o estudo tem resultados encorajadores. Submeti-me a esse tratamento no Hospital de VNGaia, e, tanto quanto me disseram, fui a primeira grávida a fazê-lo em Portugal. O Prof. Adler publica uma série de conselhos relativamente à prevenção do CMV a consultar em
http://www.vcu.edu/pediatrics/research/cmv.html
Acho que era isto que eu queria dizer. Pode ser que alguém leia antes de engravidar, pode ser que faça a diferença, mesmo que nunca se saiba se fez ou não.


quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Cada vez mais grávida



Cada vez mais grávida. Cada vez mais ansiosa.
Ontem fomos falar com o Pediatra do P. e ficámos animados. Ele acha que a ausência de qualquer anomalia ao nível do cérebro (reduzido perímetro cefálico, ventriculomegália, calcificações intracranianas, etc) permite-nos fazer um óptimo prognóstico. Nós, que andamos tão preocupados com a decisão do Hospital em que ela há-de nascer porque queremos ter a certeza de que teremos disponível um serviço de neonatologia capaz de resolver qualquer problema que venha a surgir, ficámos muito esperançados quando ele nos disse "o mais provável é que ela nem venha a conhecer nenhum serviço de neonatologia". Mas depois tenho medo de me entusiasmar de mais. Penso sempre que a queda depois é maior. Que temos que ir com calma e não deitar foguetes antes da festa. Que ainda vamos a Paris fazer mais uma ressonância magnética e uma daquelas superecografias que não se fazem aqui e que podem, pela primeira vez, revelar alguma anomalia inesperada. Há coisas que só aparecem mais tarde.
Portanto, remeto-me novamente àquele estado de espírito a que já tive que me habituar. Tudo muito contido. Nem feliz porque depois a desilusão é grande, nem triste porque as más energias não ajudam. Quase sem sentimentos, como se isso fosse possível.